Djonga denuncia ameaças ao funk e ao rap durante audiência pública
O rapper mineiro Djonga, um dos nomes mais influentes do cenário musical brasileiro na última década, participou nesta semana de uma audiência pública na Câmara Municipal de Belo Horizonte para discutir projetos de lei que, segundo especialistas e artistas, representam uma ameaça direta à cultura periférica, especialmente ao funk e ao rap.

Com falas contundentes, Djonga denunciou o que chamou de tentativa de criminalização sistemática das manifestações culturais das favelas e periferias brasileiras. “O que está em jogo não é só o funk ou o rap. É a existência do jovem preto e pobre no espaço público. É o direito dele se expressar, se divertir, se reunir e ser ouvido”, afirmou o artista.
A audiência foi convocada após a tramitação de dois projetos polêmicos que propõem medidas mais rígidas para eventos culturais em espaços públicos. Entre as propostas, estão exigências de autorização prévia com prazos mais longos, fiscalização mais severa e a possibilidade de multas altas para organizadores de “eventos com sonoridade elevada”, termo genérico que, na prática, tem sido associado principalmente aos bailes funks e rodas culturais de rap.
Cultura periférica sob ataque
Durante sua fala, Djonga ressaltou o impacto social e cultural do funk e do rap para a juventude das quebradas.
O rapper lembrou ainda que essas manifestações artísticas muitas vezes são o único espaço legítimo de expressão para jovens marginalizados pelo Estado e pela sociedade. “A favela não tem cinema, não tem teatro, não tem biblioteca. Tem o som, tem o microfone aberto, tem o baile, tem a roda. E querem tirar isso também?”, questionou.
Além de Djonga, a audiência contou com a presença de outros artistas, produtores culturais, sociólogos e representantes de coletivos periféricos. Todos foram unânimes em afirmar que as propostas em debate partem de um viés higienista e discriminatório, travestido de preocupação com a segurança e o sossego público.
Criminalização e seletividade
O cientista social Douglas Ferreira, que estuda a relação entre juventude, música e violência urbana, destacou que a perseguição ao funk e ao rap não é um fenômeno novo, mas que vem se agravando com o avanço de pautas conservadoras em várias casas legislativas do país. “Quando o som alto vem do carro de um empresário na Savassi, não é problema. Mas quando vem do paredão na favela, vira caso de polícia. Isso se chama seletividade penal e racismo institucional”, apontou.
Essa percepção também foi compartilhada por Ana Luiza Santos, produtora cultural da zona norte de BH. Ela lembrou que, mesmo com todas as dificuldades, a cultura periférica movimenta a economia criativa da cidade. “Estamos falando de geração de renda, de oportunidades. Os bailes empregam DJs, seguranças, ambulantes, motoristas de aplicativo. É hipocrisia fingir que estamos falando apenas de barulho.”
O papel do Legislativo
Durante a sessão, alguns vereadores mostraram apoio às falas dos artistas e se comprometeram a rever o texto dos projetos em tramitação. Enquanto alguns defenderam que a Câmara precisa assumir a responsabilidade de proteger e incentivar a cultura popular, e não sufocá-la, outros parlamentares argumentaram que a regulamentação busca “disciplinar excessos” e garantir a convivência harmônica entre os diferentes setores da cidade. A justificativa, no entanto, foi duramente criticada por ativistas presentes na audiência, que apontaram que o suposto “excesso” parece sempre recair sobre as mesmas expressões culturais e territórios.
Reação nas redes sociais e mobilização popular
A fala de Djonga repercutiu nas redes sociais e reacendeu o debate sobre o lugar do funk e do rap na sociedade brasileira. Fãs, artistas e movimentos culturais manifestaram apoio ao rapper e criticaram o que consideram uma tentativa de censura moderna e elitista.
Coletivos como o “Favela Vive” e o “BH na Batida” organizaram mobilizações para pressionar os vereadores e denunciar os impactos que tais leis podem causar se aprovadas. “Não vamos recuar. A favela tem voz e vai continuar se expressando. Se tentar proibir, vai ser resistência na rima, no beat e na rua”, declarou um dos organizadores da mobilização marcada para a próxima semana.
Um grito que ecoa além dos muros
A atuação de Djonga na Câmara não foi apenas um ato político, mas também simbólico: a presença de um dos maiores nomes da música brasileira em um espaço institucional carrega o peso de séculos de exclusão social, mas também de luta e reivindicação.
Ao encerrar sua participação, Djonga resumiu o espírito da audiência com uma frase que foi amplamente compartilhada online:
“Eles têm medo da nossa voz porque sabem que a nossa arte é maior do que o sistema deles."
Agora, o futuro desses projetos de lei dependerá da articulação entre os movimentos culturais e os parlamentares progressistas da Câmara de BH. Enquanto isso, o funk e o rap seguem vivos — e mais atentos do que nunca.
Por Redação
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